O plenário, ao debater liminar concedida pelo ministro
Marco Aurélio contra entendimento anterior do tribunal, precisa evitar um
choque entre poderes
A divulgação, sexta-feira, pela assessoria de imprensa do
Supremo Tribunal Federal, de decisão do ministro Marco Aurélio Mello,
determinando que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, aceitasse pedido de
impeachment do vice-presidente Michel Temer foi justificada como um erro. O
documento sequer estava assinado pelo ministro, alegava-se.
Fazia sentido a explicação, porque a aceitação do pedido
do advogado Mariel Márley Marra, naqueles termos, seria uma ingerência do STF
na esfera de decisão de outro Poder. Mas, se erro houve, foi apenas de
antecipação do que o magistrado já decidira. De fato, Marco Aurélio, na
terça-feira, viria a determinar que Cunha aceitasse o pedido de impeachment,
recusado por ele anteriormente. Daí o advogado ter recorrido ao Supremo.
É surpreendente esta liminar, por vários motivos. Um
deles, citado pelo próprio Cunha, é que o Supremo, ao julgar em dezembro a ADF
(Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) impetrada pelo PCdoB
contra o rito do impeachment da presidente Dilma, sacramentou o poder do
presidente da Câmara de aceitar ou não processos de impedimento, sem precisar
instalar comissões especiais. Em 2011, situação semelhante ocorreu com o então
presidente do Senado, José Sarney, e a Corte reafirmou o posicionamento.
Salvo depois de definições formais de jurisprudência
(súmulas vinculantes), juízes estão livres para mudar de opinião. Ocorre,
porém, que nesta matéria específica, tamanha reviravolta — a necessidade de
comissões especiais para avaliar cada pedido de impeachment, e há dezenas na
Câmara — não provocará apenas grande tumulto no funcionamento da Casa.
Terminará sendo uma barreira à abertura desses processos.
Uma questão grave é aumentar o já grande envolvimento do
Supremo no processo de impeachment de Dilma, e que tende a crescer com a
promessa do advogado-geral da União, José Eduardo Cardozo, de não economizar
nos recursos à Corte em defesa da presidente. Não há mesmo como imaginar um
impeachment de presidente sem recursos ao STF. Mas existem, nos meios jurídicos,
doutrinas opostas quanto a isso. No impedimento de Collor, por exemplo, o
Supremo, por sua composição à época, procurou deixar o Legislativo com um
espaço de manobra mais amplo.
No julgamento da ADF, em dezembro, o ministro relator do
caso, Edson Fachin, apresentou um voto mais neste sentido, em alguns pontos.
Foi vencido pelo entendimento, em direção oposta, do ministro Luís Roberto
Barroso, de cujo voto saíram as linhas básicas do rito que está sendo seguido.
Tudo conforme a Constituição.
Mas a determinação do ministro Marco Aurélio desequilibra
a balança, por invadir área do Legislativo. Ainda bem que a decisão final será
do plenário da Corte. A crise política, já grave, não pode desembocar num
choque institucional entre Judiciário e Legislativo.
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